Ideias a retirar:
Transparência e sustentabilidade são conceitos diferentes, que, embora ligados em alguns parâmetros da sua definição, não devem ser usados da mesma forma.
A transparência refere-se à quantidade e qualidade da informação divulgada por uma marca (na sustentabilidade, em referência aos seus impactos ambientais, sociais e económicos).
Se a transparência é o ato de falar, a sustentabilidade é o ato de fazer. São as práticas ambientais, sociais e económicas que depois são comunicadas.
O facto de uma marca ser transparente não significa que seja sustentável, visto que os dados divulgados podem comprovar os seus impactos negativos no ambiente e nas comunidades.
Uma marca sustentável deve esforçar-se para ser o mais transparente possível, para demonstrar os resultados da sua performance aos cidadãos.
Numa publicação de Instagram agora eliminada, a H&M apresentou-se como a “marca mais transparente do mundo” após ter alcançado o primeiro lugar do Fashion Revolution Transparency Index em 2020. Não demorou muito até que a organização negasse esta afirmação, reforçando que o seu relatório centrava apenas o trabalho de 250 marcas e que, ao contrário do que havia sido dado a entender pela H&M, a “transparência não equivale à sustentabilidade”.
Este foi um dos casos mais gritantes em que a associação entre transparência e sustentabilidade esteve na base de uma estratégia de greenwashing. Na ausência de uma definição amplamente conhecida que caracterize a transparência de uma marca, a H&M preencheu esse vazio com afirmações que apontavam para a sua performance ambiental e social. Errado. Mesmo que transparência e sustentabilidade estejam conectadas, não são sinónimos e, hoje, vamos conhecer as diferenças e similitudes entre os dois conceitos.
Falemos, primeiro, de transparência, visto ser a palavra que tende a levantar mais dúvidas. No Dicionário de Moda Sustentável, publicado pela Ethica em março de 2023, esta é definida como uma forma de “difusão de informação junto do público acerca dos processos internos que compõem o funcionamento de uma empresa ou organização”. Da mesma forma, o Fashion Revolution introduz o seu Transparency Index como “um destaque para a quantidade de informação que as maiores marcas de moda do mundo divulgam sobre as práticas e impactos da sua cadeia de produção (…)”.
Resumindo, transparência não é muito mais do que transmissão de informação. E, no mundo da sustentabilidade, tende-se a referir à informação que diz respeito às práticas ambientais, sociais e económicas de uma empresa. Por exemplo, uma marca de moda que partilha a lista completa dos seus fornecedores é mais transparente do que outra que indica somente os países onde localiza a sua cadeia de produção. Quanto mais informação é partilhada junto do público, maior é o nível de transparência de uma marca – isto é, pelo menos na teoria.
Na prática, é também preciso considerar a qualidade da informação veiculada. Como referimos antes, uma marca que partilha a sua lista de fornecedores é considerada transparente. No entanto, se se vier a descobrir que essa lista está repleta de nomes falsos, a sua credibilidade (e, por consequência, a sua transparência) é posta em causa.
Agora, como é que tudo isto se relaciona com a sustentabilidade? A informação é um dos recursos mais valiosos no combate às alterações climáticas e à injustiça social. Para perceber como e onde devemos agir, é necessário identificar o problema, e isso só se consegue com dados concretos, fiáveis e verificáveis.
Um dos exemplos paradigmáticos desta relação entre transparência e sustentabilidade encontra-se nas metas de redução das emissões de carbono. Como é que podemos perceber se uma empresa está a fazer o suficiente neste campo? Em primeiro lugar, precisamos de saber quanto a empresa emitiu nos últimos anos – só assim é que afirmações como “vamos reduzir as nossas emissões em 50%” fazem sentido. Depois, é imperativo perceber como é que a empresa realizará essa redução. Compensação carbónica? Investimento em energias renováveis? Há inúmeras opções, e todas têm impactos diferentes. Por fim, devemos estar ao corrente do quanto a empresa continuará a emitir quando atingida a sua meta. Uma redução das emissões de carbono em 50% pode parecer drástica. Porém, para algumas empresas, é uma pequena parte da sua contribuição para as alterações climáticas.
Neste e em tantos outros casos observa-se como a partilha de informação é essencial para comprovar o nível de sustentabilidade de uma empresa. Todavia, comunicar esses dados não faz de uma empresa automaticamente sustentável – é preciso que as suas ações apontem em direção à responsabilidade social e ambiental. Se a transparência é o ato de falar, a sustentabilidade é ato de o fazer.
É por isso que se diz que nem todas as marcas transparentes são sustentáveis. Isto é, nem todas as marcas que divulgam informação respetiva à sua performance ambiental e social revelam impactos positivos na sua cadeia de produção. Contudo, todas as marcas sustentáveis devem ser transparentes – visto que a informação é a melhor ferramenta de responsabilização e de aproximação ao público.
Voltemos, então, à H&M. Embora já não lidere o Fashion Revolution Transparency Index em 2023, a marca continua a ser uma das mais transparentes entre os casos analisados pela organização de moda. Será que isso significa que é uma das mais sustentáveis? Para responder a essa questão, é necessário avaliar a informação veiculada. Quando o fazemos, chegamos rapidamente à conclusão de que a transparência realizada pela H&M é seletiva. Encontramos listas de fornecedores, bem como compromissos ambientais, mas não é partilhado o volume de produção e de desperdício têxtil anual – fatores que contribuem em grande parte para a insustentabilidade do caso em questão. A transparência é o primeiro passo para a sustentabilidade, mas está longe de ser o último.
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