Ideias a retirar:
As características que formam os modelos de fast fashion são opostas aos valores da sustentabilidade.
Ao nível ambiental, o excesso de produção é responsável pelo consumo elevado de recursos e pela criação de desperdício têxtil.
Ao nível social, a complexidade das cadeias de produção dificulta a transparência e põe em causa o tratamento digno dos trabalhadores.
As marcas de fast fashion podem, sim, ser mais sustentáveis, mas apenas se alterarem drasticamente o seu modelo de operação.
Integração de materiais reciclados, criação de códigos de conduta exigentes… São várias as práticas que têm procurado aproximar as marcas de fast fashion da sustentabilidade. No entanto, será que isso é suficiente? Em resumo, não. As marcas de moda rápida podem, sim, tornar-se mais sustentáveis, mas nunca enquanto mantiverem o modelo de operação vigente.
Para percebermos o contributo da fast fashion para a insustentabilidade do setor têxtil e de vestuário, é imperativo compreender os processos de produção que a caracterizam. Como o nome indica, falamos de uma cadeia de fabrico rápida, que afeta todos os passos, desde o design à manufatura, incluindo o próprio tempo de vida do produto. É também um modelo marcado por preços baixos, obtidos através de uma produção em grandes volumes e da subcontratação de mão-de-obra em países do Sul global, onde os salários são mais baixos (em comparação ao Norte global).
Os atributos acima referidos, que constituem a definição de fast fashion, são também os motivos pelos quais o modelo de produção não pode ser classificado como sustentável. Os maiores obstáculos ocorrem ao nível ambiental e social, e serão detalhados nos próximos parágrafos. Tudo começa com uma pergunta: como é que as marcas de fast fashion conseguem preços tão baixos?
Em primeiro lugar, graças a uma prática económica conhecida como economias de escala. Quanto mais unidades uma marca produz do mesmo item, mais barato é o seu custo de produção. Por esse motivo, o modelo de operação da moda rápida assenta em volumes elevados de produção, por vezes superiores à procura do consumidor. Tal negligencia os princípios da sustentabilidade em dois pontos da cadeia: na produção e no descarte.
Na produção, o problema é uma simples questão matemática: quanto mais itens são produzidos, mais recursos são consumidos para a sua produção. Estes podem ser água, eletricidade e outros materiais necessários à sua composição. Vale a pena considerar que a grande maioria da oferta de marcas de fast fashion é concebida a partir de fibras derivadas de plástico, como poliéster e nylon. Nesse sentido, esta fação da indústria têxtil é uma grande consumidora de combustíveis fósseis, o que é também um entrave à sua sustentabilidade ambiental.
No descarte, ressalta a poluição causada pelo desperdício. Como uma parte significativa das peças produzidas por marcas de fast fashion nunca chegam a ser vendidas (e, as que são vendidas, deterioram-se rapidamente), estas são responsáveis pela acumulação de “lixo” têxtil em aterros, muitas vezes localizados em países do Sul global. Embora possam ser aplicados sistemas de reciclagem e reutilização que ajudam a recuperar estas peças de roupas, nada será mais sustentável do que reduzir os volumes de produção e eliminar o excesso. No entanto, por ser um fator crucial à manutenção de preços baixos, são raras as marcas de fast fashion que adotam esta solução.
Mas não é só através dos volumes de produção que a moda rápida consegue minimizar os seus custos na cadeia de fabrico. O outro grande obstáculo à sustentabilidade deste setor é social. A grande maioria das marcas de fast fashion não possui produtores in-house, privilegiando práticas de subcontratação de fábricas frequentemente localizadas no Sul global. Tal traz benefícios económicos às empresas, dado que os custos de produção são reduzidos em resultado de salários mais baixos e fracas leis laborais e de proteção ambiental. É também uma forma de reduzir a responsabilidade que detêm sob as práticas ocorridas na cadeia de produção, ao agirem através de intermediários para a subcontratação.
Esta realidade complica a garantia de duas práticas cruciais à sustentabilidade de uma empresa: a transparência e o tratamento digno dos seus trabalhadores. Por serem cadeias globalizadas e complexas na sua formação, torna-se mais difícil recolher informação acerca do seu funcionamento e, por conseguinte, comunicá-la aos consumidores. O facto de se aplicarem fortes códigos de conduta às fábricas subcontratadas não significa que estes sejam cumpridos, devido à falta de fiscalização levada a cabo por organizações independentes.
Para além disso, as marcas de fast fashion tendem a fixar os preços que querem pagar aos seus fornecedores, o que reduz o poder dos gestores das fábricas. Mesmo que estes queiram pagar salários mais elevados aos seus trabalhadores ou melhorar as condições do local onde operam, não é possível fazê-lo enquanto as empresas não considerarem esses custos no valor que aceitam pagar pela produção de cada item. De que vale aumentar o conteúdo reciclado num produto de moda se o trabalhador que o fabricou continua a receber menos do que um salário digno pela sua função? Não existe sustentabilidade sem sustentabilidade social.
Todas estas características que preservam o funcionamento do modelo de moda rápida são opostas às práticas de sustentabilidade que as marcas referem querer atingir. Isso não implica que seja impossível para tais marcas tornarem-se mais sustentáveis. Todavia, para tal acontecer, é necessário que alterem drasticamente a forma como operam, baseando os novos sistemas nos princípios da sustentabilidade. Seja do ponto de vista social ou ambiental, a fast fashion nunca será sustentável enquanto se mantiver fast fashion.
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